Corpo e alma sempre estiveram juntos, mas nossa sociedade, cartesiana e narcisista, os separou. Em seu diálogo, O banquete, Platão escreve sobre o mito do andrógino, indivíduo perfeito em que o feminino e o masculino coabitavam o mesmo ser, a ponto de sua plenitude incomodar os deuses que os apartaram para sempre. Errantes, homens e mulheres transitam pelo mundo procurando a parte perdida. Assim como o gênero se partiu, também a alma e o corpo parecem ter pesos e lugares diferentes numa sociedade que cultua o parecer em detrimento do ser. Pobre corpo, espetado, cortado e costurado, raspado, apertado, pintado, dilacerado antes de ser exposto nas redes sociais, em geral sorrindo, apesar da dor. Pobre alma, calada, censurada, obnubilada, esquecida e amargurada, obrigada que é a pactuar com o embuste da vida perfeita.
No dia 30 de setembro, o Coletivo É trouxe Meira Souza e Renata Melo para falar conosco e com nossos convidados sobre comunicação com comunidades e bem-estar do ponto de vista da saúde integral, aquela que considera o corpo como reflexo da alma. Segundo Renata, das cinco emoções primárias – o medo, a raiva, o nojo, a alegria e tristeza – observamos a evolução de um gráfico que nos leva ao terror, à fúria e à vingança, à aversão, à euforia e à depressão caso não saibamos lidar com as situações em que somos desafiados a sentir.
Persistindo na omissão ou na violência de crenças aprendidas como engolir o choro, não manifestar desagrado, fingir partilhar das vitórias alheias, negar o temor, as emoções colam em nosso corpo e nos fazem mal. Para Meira, é a hora em que sofrem o estômago, o coração, a garganta, o intestino, o pulmão, o pâncreas e a coluna vertebral. Para ela, tudo é resultado de um cérebro que vive contrariado.
Dito assim, parece que todas as doenças que nos acometem têm origem na alma. Será? Sim, para as duas especialistas, mesmo aquelas doenças ditas congênitas, das quais somos fadados a acreditar que não escaparemos, dependem da forma como lidamos com nossas emoções o que fazemos com elas. E sim, as pessoas ficam doentes porque escolhem adoecer, criando condições para escapar de contextos que não conseguem enfrentar e dos quais querem fugir, nem que seja pela dor e pela limitação.
Respirar nos ajuda nos momentos de raiva. Comer é um exercício de autocuidado quando mentalizamos alimentar o corpo, mas também a alma. Dormir é um aconchego na tristeza. Abraçar os amigos é uma maneira de aumentar a ocitocina, o hormônio da felicidade. Meditar é um caminho sem volta para a calma. Praticar exercícios físicos aumenta nossa imunidade e clareia os pensamentos. Falar o que sente é uma terapia para a amargura, o ressentimento e a carência.
Estamos sós com nosso corpo e com nossa alma. Mesmo cercados de gente, somos os autores do destino que queremos para a integridade do nosso ser. Ficar doente é uma rota espinhosa, cercada de nãos e de vários talvez, assim como a vida. Então se puder escolher, escolha a rota mais bonita, aquela que vai compensar os revezes e as perdas que todos teremos na trajetória humana de não saber, mas de querer aprender. Seja mais, parecer é fake.